Após uma investigação que se arrastou por quase quatro anos, a Procuradoria Geral da República (PGR) denunciou três deputados federais do PL do Maranhão pelo crime de corrupção envolvendo desvio de recursos de emendas parlamentares. Segundo a Polícia Federal, o grupo atuava por meio de um “grupo armado” que cobrava de prefeitos parte dos recursos que eram enviados por meio das emendas.
Em depoimentos aos quais O GLOBO teve acesso, integrantes do suposto “grupo armado” admitiram fazer cobranças em pelo menos quatro prefeituras, recebendo por esses ‘trabalhos’ uma comissão de até 10%. As ‘dívidas’ relatadas chegavam a R$ 1 milhão, valor que a PF acredita ser proveniente de emendas parlamentares.
A denúncia foi apresentada no mês passado, em um inquérito que tramita em sigilo no STF. Além dos deputados Bosco Costa (PL-SE), Pastor Gil (PL-MA) e Josimar Maranhãozinho (PL-MA), outros seis membros do suposto grupo criminoso foram denunciados. Procurados, Bosco Costa e Pastor Gil não responderam. Maranhãozinho, por sua vez, negou qualquer participação em desvio de recursos e disse acreditar que o caso será “arquivado quando seus advogados apresentarem suas alegações no processo”.
Entenda o caso
Em dezembro de 2020, durante uma operação das forças de segurança do estado do Maranhão, a polícia apreendeu com três membros do chamado “braço armado” dos deputados carros em nome de uma prefeita e do filho de um segundo chefe de executivo municipal, além de cheques de mais de R$ 1 milhão e uma planilha contendo informações sobre emendas parlamentares enviadas a prefeituras. Por atingir pessoas com foro, o caso subiu para o Supremo Tribunal Federal.
Um dos alvos da operação, o cabo reformado da Polícia Militar do Maranhão Abraão Nunes Martins Neto admitiu em depoimento que foi recrutado para cobrar dívidas de prefeitos e, com isso, receberia uma comissão de 10% sobre cada valor. O cabo alegou, porém, que “não sabia” que os recursos eram provenientes de emendas parlamentares, conforme aponta a PF. O militar reformado relatou que fazia a cobrança diretamente nas casas dos prefeitos e até mesmo nas prefeituras, quando esses não eram encontrados em suas residências. O militar também disse que recebia esses valores por meio de cheques e dinheiros em espécie.
A PF aponta que o grupo realizava as cobranças portando armas. Segundo Abraão, um agiota de nome Josival Cavalcanti da Silva, conhecido como Pacovan, foi quem o recrutou para cobrar os valores dos prefeitos. O PM disse que a orientação de Pacovan, suposto elo entre deputados e os cobradores, era para que ele fosse “duro” nas cobranças. O PM, no entanto, disse que agia com “diplomacia”. Com o militar, a polícia encontrou um colete à prova de balas e uma arma. Pacovan foi morto a tiros em junho deste ano por circunstâncias que ainda são apuradas pela justiça do Maranhão.
Em depoimento antes de ser morto, o suposto líder dos cobradores negou participação em crimes relacionados a emendas. Questionado se conhecia o deputado Josimar Maranhãozinho e outros políticos, Pacovan disse que conhecia o parlamentar mas” nunca tratou de emendas com ele”. Com o agiota, foram encontrados dois carros: um em nome de uma prefeita do Maranhão e outro em nome de um filho de um prefeito do Piauí.
As investigações tiveram início após um prefeito procurar a polícia para relatar ter sido ‘visitado’ pelo grupo de Pacovan para cobrar valores referente a emendas enviadas ao município. O então prefeito do município de São José de Ribamar (MA), Eudes Sampaio, relatou ainda ter sido alvo de extorsões do grupo.
À PF, o prefeito Eudes apresentou um documento, ao qual O GLOBO teve acesso, detalhando os recursos alvos das cobranças: trata-se de um estrato de pagamento do Ministério da Saúde para investimentos no município. São três empenhos que totalizavam R$ 6,6 milhões. Era sobre esse valor, segundo os investigadores, que era feita a cobrança de pelo menos R$ 1 milhão ao prefeito.
Também em depoimento, Adones Gomes Martins, irmão do PM reformado Abraão Nunes Martins Neto, confirmou ter procurado o prefeito Eudes, a pedido de Pacovan, para cobrar mais de R$ 1 milhão. Adones disse, porém, não saber a origem dos recursos cobrados.
Procurados, o PM reformado e seu irmão não retornaram aos contatos. A prefeitura de São José do Ribamar também não respondeu.
Após o caso subir para o STF, em 2022, os três parlamentares foram alvos de uma operação de busca e apreensão. A medida foi autorizada pelo então ministro Ricardo Lewandowski (hoje ministro da Justiça). Com a aposentadoria do relator no ano passado, o caso passou para Cristiano Zanin.
Conforme mostrou O GLOBO em março de 2022, chamou atenção dos investigadores, inclusive, que o deputado Bosco Costa, apesar de ser do estado de Sergipe, destinou uma emenda de R$ 4 milhões à prefeitura de São José de Ribamar. O objetivo era que R$ 1 milhão, o equivalente a 25%,retornasse em dinheiro vivo aos parlamentares. (O Globo)
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